A ansiedade é um mecanismo natural evolutivo que desempenha papel crucial na sobrevivência humana. No livro “O Cérebro Ansioso”, o neurologista Leandro Teles explora este fenômeno biológico universal, descrevendo-o como “um conjunto de emoções e reações corporais que antecedem o novo, o desafio ou uma experiência de alguma forma arriscada ou estressante”.

A obra apresenta a dualidade da ansiedade: benéfica quando proporcional e contextualizada, funcionando como sistema de alerta; porém, quando desregulada, manifesta-se como transtorno, causando sofrimento desproporcional e reduzindo o rendimento emocional e cognitivo. Como o autor ilustra poeticamente através de uma passagem de “O Pequeno Príncipe”: “Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade!” Essa antecipação emocional representa a face saudável da ansiedade.

Na sociedade contemporânea, vivenciamos uma epidemia de ansiedade patológica, com 15% a 20% dos adultos apresentando alguma forma durante a vida, predominantemente em mulheres. Para explicar seu funcionamento, Teles apresenta o conceito da resposta de “luta ou fuga”, usando a metáfora de um ancestral encontrando um leão. Neste cenário, o corpo desencadeia alterações mediadas pela adrenalina e pela ativação do sistema nervoso simpático: batimentos acelerados, respiração rápida, aumento da pressão arterial, direcionamento do sangue para os músculos, dilatação das pupilas, entre outras. Essas mudanças físicas acompanham alterações psíquicas e cognitivas.

O sistema de resposta envolve estruturas cerebrais específicas, principalmente a amígdala, localizada no lobo temporal, fundamental para gerenciar o medo e participante de circuitos importantes de memória e controle emocional. Quando ativada pelo reconhecimento de perigo, a amígdala comunica-se com o hipotálamo, que ativa o sistema nervoso simpático e estimula a liberação de hormônios como adrenalina e cortisol.

Os transtornos de ansiedade manifestam-se como Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), Síndrome do Pânico (SP), Síndrome do Estresse Pós-Traumático (SEPT), Transtornos Obsessivo-Compulsivos (TOC) e fobias específicas. Os sintomas aparecem em três esferas: psíquica, física e cognitiva. O diagnóstico é meramente clínico, baseado na interpretação profissional dos sintomas relatados e observados, considerando o impacto na qualidade de vida.

Teles ilustra cada transtorno com casos clínicos como o de Jéssica, uma chef de cozinha que teve uma crise de pânico aos 25 anos. Durante sua crise no metrô, ela relata: “Minha visão ficou levemente turva, o ar me faltou. Nunca tive asma, mas imagino que seja similar: parecia que meu pulmão tinha encolhido dentro do peito. Meu coração acompanhou minha respiração frenética e superficial e acelerou, forte e inquieto.” Esta descrição vívida mostra como a ansiedade patológica produz uma cascata de sintomas físicos sem a presença de um verdadeiro perigo.

Quanto às causas, o autor analisa a interação entre fatores genéticos e ambientais. Estudos demonstram predisposição genética, mas Teles questiona por que esses genes permaneceram na espécie: “Penso eu que estes são genes interessantes – se não para um indivíduo específico em um contexto específico, são interessantes para uma espécie. A evolução genética é um processo relativamente lento, o DNA muda em uma taxa mais vagarosa que o mundo, sendo que o mundo mudou muito e rapidamente. Hoje, vivemos em um território ambiental capaz de desarranjar esses genes que outrora foram importantes para a sobrevivência. O DNA está certo; nosso modo de vida talvez não.” Fatores ambientais incluem experiências traumáticas, estilo de vida contemporâneo, falta de válvulas de escape saudáveis e má administração do ritmo de vida.

Para o tratamento, o autor delineia seis passos fundamentais que incluem buscar ajuda profissional, obter diagnóstico correto, implementar mudanças no estilo de vida, realizar psicoterapia, utilizar medicamentos quando necessário e manter seguimento do tratamento. Teles enfatiza dois conceitos fundamentais para recuperação: resignação e resiliência.

A obra proporciona uma compreensão abrangente dos mecanismos da ansiedade, combinando conhecimento científico com narrativas humanizadas. Ao citar Neil Gaiman, Teles transmite esperança: “Contos de fadas são mais que verdade. Não porque nos dizem que dragões existem. Mas porque nos dizem que eles podem ser derrotados.” De forma análoga, embora os transtornos ansiosos existam, é possível superá-los com conhecimento adequado, suporte profissional e mudanças conscientes.

O livro desmistifica os transtornos mentais, apresentando a ansiedade patológica não como fraqueza de caráter, mas como desarranjo biológico influenciado por fatores diversos, para o qual existem intervenções eficazes. Simultaneamente, ressalta a importância da participação ativa na recuperação: “Ninguém se cura de fora para dentro. Sua melhor serotonina já está por aí, na sua versão caseira, feita no forno a lenha da consciência, orgânica, com cheiro de café recém-coado, gosto de broa de milho quentinha, mas você precisa procurar direito, em cada cantinho da mente, além da bagunça, da fumaça, da poeira, seguindo as pistas da sua própria essência.”

Em um mundo onde as exigências aumentam e o tempo para processá-las diminui, entender os limites entre a ansiedade funcional e a patológica torna-se essencial. Como Teles poeticamente sugere, nossa mente é moldada tanto pelos genes que carregamos quanto pelas experiências que vivemos e escolhas que fazemos. O verdadeiro poder está em reconhecer quando o sistema de alerta, evolutivamente projetado para nos proteger, começa a nos aprisionar. Neste momento, podemos escolher um caminho diferente – não para eliminar completamente a ansiedade, mas para transformá-la novamente em aliada, permitindo que ilumine possibilidades futuras sem ofuscar a beleza do presente. Este equilíbrio sutil é a verdadeira arte de viver em uma era ansiosa.